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Racismo recreativo e religioso geram dano moral e rescisão indireta a vendedora

29/04/2025 08:59h

Decisão proferida na 13ª Vara do Trabalho da Zona Leste (SP) condenou uma empresa a pagar danos morais no valor de R$ 50 mil a uma vendedora angolana vítima de assédio moral, materializado em reiteradas e odiosas condutas discriminatórias. As agressões também motivaram a conversão do pedido de demissão em rescisão indireta. De acordo com os autos, os xingamentos eram feitos verbalmente e por Skype.

Em audiência, a testemunha autoral relatou que dois chefes falavam que a trabalhadora cheirava mal, utilizando termos como “sovaquenta” e que a chamavam de “Juma” para dizer que ela não tinha asseio ou civilidade. O depoente revelou também que um supervisor disse que a trabalhadora pertencia a uma classe moralmente inferior em termos religiosos, porque a crença dela matava animais. Contou ainda que a ré não adotou providências para impedir comportamentos desse tipo.

Contestação

Na contestação, a companhia alegou que o apelido “Juma” teria sido utilizado em conversa restrita e o apresentou como algo inofensivo e até mesmo elogioso. No entanto, para a juíza Aline Soares Arcanjo, “resta evidente a prática de racismo recreativo”.

Decisão

Na decisão, ela destacou o Protocolo para Julgamento com Perspectiva Racial do Conselho Nacional de Justiça (Resolução 598/2024). A orientação estimula a reflexão sobre “o impacto de microagressões raciais, que são manifestações sutis frequentemente disfarçadas de comentários inofensivos ou brincadeiras”. E ponderou que, embora subestimada, essa conduta tem impactos profundos no ambiente de trabalho e na vida das pessoas.

Racismo religioso

A magistrada analisou também o racismo religioso do qual a reclamante foi vítima, mencionando o Protocolo para Atuação e Julgamento com Perspectiva Antidiscriminatória, Interseccional e Inclusiva, organizado pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST) e pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT). De acordo com o documento, o racismo religioso consiste em um “conjunto de práticas violentas que expressam a discriminação e o ódio pelas religiões de matriz africana ou indígenas, por seus adeptos, assim como pelos territórios sagrados, tradições e culturas afro-brasileiras ou indígenas”. A norma também foi utilizada na apreciação do caso diante da “nítida sobreposição de múltiplos fatores de discriminação, destacadamente gênero e raça”.

Ao julgar, a magistrada pontuou que “a falta de resposta patronal apenas reforça a discriminação múltipla, estrutural e institucionalizada a que era submetida a reclamante” e concluiu que ficou evidenciada a violação à dignidade e aos direitos da personalidade da trabalhadora.

Por fim, destacou que a mulher não pediu demissão porque obteve novo emprego, mas foi compelida a procurar outro serviço dada a situação insustentável. Conforme depoimento, a autora saiu da ré para trabalhar em outro local, recebendo comissões mais baixas e R$ 1 mil a menos de salário fixo para “poder ter paz de espírito”.

Considerando as práticas constatadas, a juíza determinou a expedição de ofícios ao Ministério Público do Trabalho, Ministério Público Federal e ao Ministério Público Estadual para providências cabíveis. O processo está pendente de análise de recurso.

29/04/2025 08:59h



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