TRF4 cancela concessão de exploração de radiodifusão à empresa de televisão
23/07/2019 09:24h
A 3ª Turma da corte entendeu, de forma unânime, que houve desvio de finalidade na exploração do serviço, pois a empresa não cumpriu o exigido pela legislação quanto à veiculação de programação de natureza informativa em sua grade.
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) declarou o cancelamento da outorga de concessão do direito de exploração de serviços de radiodifusão para a uma empresa de televisão, localizada na cidade de Cachoeira do Sul (RS). A 3ª Turma da corte entendeu, de forma unânime, que houve desvio de finalidade na exploração do serviço, pois a empresa não cumpriu o exigido pela legislação quanto à veiculação de programação de natureza informativa em sua grade. A decisão foi proferida em sessão de julgamento.
O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou ação civil pública, em setembro de 2013, contra a União Federal, a empresa de TV e os seus sócios. O órgão ministerial requisitou à Justiça Federal gaúcha que declarasse a nulidade do ato administrativo da União que havia renovado a concessão de outorga para a empresa de TV explorar serviços de radiofusão de sons e imagens. Também solicitou ao Judiciário a declaração de caducidade da concessão que havia sido outorgada à empresa, originalmente, por meio de Decreto em dezembro de 1980. Ainda foi requerida a condenação solidária da empresa de TV e dos seus sócios ao pagamento de indenização por danos morais coletivos no valor de 1 milhão e 100 mil reais em favor dos cidadãos de Cachoeira do Sul, a ser destinado para projetos de entidades beneficentes e culturais no município.
O MPF alegou que o decreto que outorgou à empresa o direito de estabelecer uma estação de radiodifusão de sons e imagens estabeleceu diversas obrigações à concessionária, dentre elas não transferir, direta ou indiretamente, a concessão, sem prévia autorização do Governo Federal, reservar cinco horas semanais para veiculação de programas educacionais e veicular, no mínimo, 5% do horário de sua programação diária a programas informativos. Segundo o autor da ação, foram apuradas por meio de inquérito civil, diversas irregularidades em relação à concessão, de forma que os sócios da empresa de TV teriam desvirtuado a finalidade original da outorga, transformando os serviços prestados pela concessionária em eminentemente comerciais, e assim, inexistindo interesse público para justificar a renovação da outorga.
O MPF acrescentou que uma fiscalização realizada pela ANATEL concluiu que a concessionária não cumpriu com as obrigações previstas no decreto de concessão, principalmente quanto à falta de conteúdo informativo e educativo, não respeitando o limite máximo de publicidade comercial estabelecido na Lei Federal 4.117/62, pois foi verificado que quase 100% de sua transmissão referia-se à publicidade comercial. Ainda defendeu ser ilícita a venda da concessão praticada pela sociedade que havia recebido originariamente a outorga porque envolveu alteração dos contratos sociais e transferências das ações sem autorização do Governo Federal.
Por fim, o MPF apontou que o desvio de finalidade da concessão, marcado pelo prejuízo do direito de informação à população em vista da ausência de veiculação de conteúdo informativo local na grade de programação, causou os danos morais coletivos. O juízo da 1ª Vara Federal de Cachoeira do Sul, no entanto, julgou a ação civil pública improcedente, negando os pedidos formulados.
O órgão ministerial recorreu ao TRF4, pleiteando a reforma da sentença. A 3ª Turma do tribunal decidiu, por unanimidade, conceder parcial provimento à apelação cível para declarar o cancelamento da concessão outorgada por Decreto à empresa de TV.
A relatora do processo na corte, desembargadora federal Vânia Hack de Almeida, declarou que “decorre da finalidade informativa do serviço de radiodifusão - princípio expresso no art. 221, I, da Constituição Federal - a necessidade de que seja destinado um mínimo de 5% da grade de programação diária da detentora da outorga à transmissão de serviço noticioso, de acordo com a Lei 4.117/62”.
Ela seguiu destacando que “comprovou-se nos autos que, sob a denominação fantasia de ‘Shop Tour’, a titular da outorga destinou a totalidade de sua programação à veiculação de propaganda comercial de lojistas de estado da federação distinto daquele onde situada a estação geradora, privando, com isso, a comunidade da promoção e do acesso à informação local”. Dessa forma, a magistrada ressaltou que “diante da prova coligida aos autos, comprovou-se o desvio de finalidade da exploração do serviço de radiodifusão, autorizando-se, com isso, a interveniência do Poder Judiciário para, com fundamento no artigo 223, §4º, da Constituição Federal, cancelar a outorga até então vigente”.
Sobre a suposta ilegalidade na venda da concessão, com alteração do contrato social, apontada pelo MPF, a relatora reforçou que “no caso dos autos demonstrou-se que, inobstante a alteração do contrato social tenha sido redigida em momento anterior à anuência do órgão concedente, seu registro perante a Junta Comercial - requisito para que seus efeitos sejam imputáveis a terceiros - ocorreu somente após a autorização dada pela autoridade pública competente, de onde se conclui pela ausência de ilegalidade no ato”. Ao negar a indenização pelos danos morais, Vânia pontuou que “o dano moral coletivo tem lugar nas hipóteses onde exista um ato ilícito que, tomado individualmente, tem pouca relevância para cada pessoa; mas, frente à coletividade, assume proporções que afrontam o senso comum. Pela situação dos autos não se identifica ter sido suprimido o direito de promoção e de acesso à informação local pela comunidade afetada, haja vista que tal direito manteve-se protegido diante da existência de outros meios de comunicação social na localidade”.
Nº 50018152420134047119/TRF
23/07/2019 09:24h